A Comissão do Trabalho, da Previdência Social e da Assistência Social da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) aprovou parecer de 1º turno contrário ao Projeto de Lei Complementar (PLC) 46/20, de autoria do governador do Estado, em reunião na manhã desta quarta-feira (26/8/20). A proposição altera legislações anteriores, cria nova autarquia e fundos de previdência, muda regras de aposentadorias e de pensões para os servidores públicos civis do Estado, entre outras alterações.
O relatório do presidente da comissão, deputado Celinho do Sintrocel (PCdoB), foi aprovado com quatro votos favoráveis e muitos elogios por parte dos parlamentares. O único voto contrário foi do deputado Gustavo Valadares (PSDB), líder do Bloco Sou Minas Gerais, a quem coube defender a proposta de reforma do governador Romeu Zema. "Esse relatório não me representa", disse Gustavo Valadares. Em sua opinião, fazer a reforma é o único meio de garantir o equilíbrio financeiro do Estado e o pagamento das aposentadorias futuras.
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"O relatório pode não te representar, deputado, mas representa o desejo de mais de 85% dos servidores públicos mineiros, por exemplo, que ganham os menores salários e sustentam toda a prestação de serviços de saúde, educação e segurança neste Estado", rebateu o relator Celinho do Sintrocel, em resposta ao colega Gustavo Valadares.
Celinho lembrou sua história pessoal, sua ligação com os movimentos sindicais e disse que não poderia apresentar um relatório que não fosse contrário à proposta do governo. Na opinião do relator, o projeto do Executivo desconsidera o caráter solidário e intergeracional da previdência e o próprio papel dos servidores públicos na prestação dos serviços essenciais à população.
Agora, o PLC segue para apreciação da Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária (FFO), antes de ir a votação, em Plenário. Reuniões na FFO estão agendadas para esta quarta (26). O vice-presidente da Comissão do Trabalho, deputado André Quintão (PT), que presidiu a reunião desta quarta (26), acredita que o Executivo não terá os 48 votos necessários à aprovação do projeto. "A maioria dos deputados não vai querer entrar para a história como responsáveis por destruir a vida dos servidores públicos, em meio a uma pandemia", disse o parlamentar.
Falta de dados - Mais uma vez, deputados do Bloco Democracia e Luta, do qual o deputado André Quintão é líder, questionaram o fato de o Executivo não ter enviado à Assembleia os cálculos atuariais e os demais dados sobre a situação do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado (Ipsemg), por exemplo, que justificassem as mudanças pretendidas pelo governo. "Fizemos várias solicitações e nenhuma foi respondida. Esse projeto não tem base técnica nenhuma, só demonstra a intenção política do governo de desmontar os serviços públicos", afirmou a deputada Beatriz Cerqueira (PT).
As deputadas Andréia de Jesus (Psol) e Ana Paula Siqueira (Rede) e o deputado Betão (PT) também criticaram duramente o PLC 46, fazendo referências, ainda, à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55/20, que também compõe a reforma enviada pelo governo à Assembleia.
"Não sou contra essa reforma apenas, mas contra todo esse modelo de Estado que retira direitos e proteção social dos cidadãos e penaliza ainda mais as mulheres", disse Andréia de Jesus. Se aprovados os projetos do governo, a deputada promete denunciar o fato à Organização Internacional do Trabalho (OIT), à Organização das Nações Unidas (ONU) e a outros organismos internacionais.
O deputado Professor Cleiton (PSB) também disse que não vai "dar um cheque em branco para o governo", diante da falta de dados técnicos que embasem o aumento de alíquotas de contribuição e da idade mínima para aposentadoria. Todos os opositores alegam que, ao aumentar alíquotas e tempos de contribuição, e acabar com benefícios, o governo está, na prática, jogando toda a responsabilidade pelo déficit nas contas públicas "nas costas dos servidores".
Relatório aponta o que seriam os principais problemas do PLC
Em seu relatório, o deputado Celinho do Sintrocel destaca que a reforma pretendida pelo governo não garante equilíbrio das contas públicas nem garante o futuro das aposentadorias, como defendem os deputados governistas. Com relação ao Ipsemg, cuja estrutura está sendo modificada pelo texto do PLC, o relator afirma que também não foi encaminhado à ALMG nenhum estudo que indicasse problemas na gestão do instituto. "Ao contrário disso, o relatório de Gestão do Exercício Financeiro de 2019 demonstra que o Ipsemg desempenha suas atribuições de forma equilibrada", destaca o parecer.
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Sobre a criação do Fundo Estadual de Previdência do Estado de Minas Gerais (Fepremg), o deputado observa que o referido fundo não contará com a participação dos servidores em sua gestão, além de o projeto não deixar claro de onde virão os recursos a ele destinados. Na opinião do relator, o objetivo das mudanças propostas pelo Executivo é "preparar o caminho para uma futura privatização da saúde dos servidores prestada hoje pelo Ipsemg a cerca de 820 mil beneficiários".
"Decidir agora, de forma açodada, pela mudança na gestão da previdência, pode levar a um resultado desastroso para as contas públicas, como foi a aprovação do fim do Funpemg, em 2013", conclui o relator, que também criticou duramente as alterações propostas nas regras para concessão de pensões por morte ou incapacidade permanente.
Mulheres - O parecer aprovado pela Comissão de Trabalho, rejeitando o PLC 46, também destaca o prejuízo que a reforma traria às mulheres, com a elevação do tempo mínimo de contribuição e da idade mínima para aposentadoria, que passaria de 55 para 62 anos. Em sua avaliação, no caso das professoras, as regras de cálculo são ainda mais perversas, uma vez que, para se aposentar com 100% da média de todos os salários de contribuição, ela precisará contribuir por 40 anos, 15 anos de contribuição a mais, em relação à regra atual.
"É justo obrigar uma professora a passar 40 anos dentro de uma sala de aula, para ter direito a 100% da média salarial, que já é baixa?", questionou Celinho do Sintrocel.
Alíquotas - Outro ponto que teria levado o relator a apresentar parecer contrário ao projeto é o aumento das alíquotas de contribuição. Para o presidente da Comissão do Trabalho, o argumento do governo de que vai cobrar mais de quem ganha mais é falho, pois, na prática, todos serão penalizados e terão redução de salários, principalmente os que ganham menos, tanto os ativos quanto os aposentados.
Ao passar de uma alíquota única de 11% para uma alíquota progressiva que varia de 13% a 19%, conforme as faixas remuneratórias previstas no PLC, o Governo de Minas estaria cobrando dos servidores contribuições muito maiores do que as previstas na Emenda Constitucional 103, de 2019, para os servidores da União e para o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), que hoje variam entre 7,5% e 19%.
Tanto o parecer do deputado Celinho do Sintrocel, quanto os demais deputados opositores que se manifestaram durante a reunião, criticam o fato de o governo não buscar outras alternativas consistentes para a melhoria das contas públicas, como novas receitas tributárias, a revisão da política de isenções fiscais para empresas e da própria relação com a União.