Calma! Aqui estou me referindo ao saboroso prato que a maioria adora, que será a entrada para o tema principal do artigo.
Registros históricos indicam que a origem da pizza se deu provavelmente na Grécia ou no Egito. Ao misturar farinha, água e sal, os habitantes produziam uma massa, inicialmente em formato de calzone, e a consumiam com azeite e ervas. Depois, na Itália, a pizza, já em formato de disco, ficou marcada como alimento dos humildes, com a massa coberta por tomate, manjericão, muçarela e fragmentos de peixe.
A comemoração do Dia Mundial da Pizza teve origem em Nápoles, no mês de fevereiro e, mais tarde, ganhou destaque nos Estados Unidos e, posteriormente, pelo mundo afora. No Brasil celebra-se o Dia da Pizza desde 1935, quando se realizou um concurso de pizza que terminou em 10 de julho, data então escolhida como Dia da Pizza.
Contextualizada a data, recentemente comemorada, temos que atualmente a pizza deixou de alimentar os humildes e tornou-se alimento requintado, com sabores gourmet, dentre os quais minha opção é a vegetariana, mas aqui a pizza é apenas a entrada para a reflexão sobre a fome, a desigualdade e o exercício da solidariedade e da cidadania.
A letra da música “É problema” de Matheus e Kauan traz que “quem tem saudade, sofre, quem sofre tem sede, quem tem sede, bebe, mas quem bebe, lembra, é problema puxando o problema”. Trazendo para o tema, quem é mais necessitado sofre, quem sofre tem fome, quem tem fome, come, mas quem não tem comida lembra: é problema puxando problema.
O “problema” aqui passa pelos modos de produção e consumo cada vez mais excludentes e irracionais para o equilíbrio sistêmico do planeta. O tema é abordado por Luiz Marques na obra Capitalismo E Colapso Ambiental e por Ladislau Dowbor, na sua obra em lançamento Pão Nosso De Cada Dia: opções econômicas para sair da crise. Este modo de produção e consumo gera exclusões e potencializa desigualdades, tema destacado por Tomas Piketty e por instituições como a Oxfam Brasil, com destaque para seu recente trabalho: Nós e As Desigualdades 2021. A pesquisa revela que, no Brasil, o percentual da população que vive na extrema pobreza quase triplicou desde o início da pandemia, passando de 4,5% para 12,8%. No final de 2020, mais da metade da população – 116 milhões de pessoas – enfrentava algum nível de insegurança alimentar, das quais quase 20 milhões passavam fome.
A perversidade do sistema no tocante à alimentação é evidenciada no fato de que a produção nacional de alimentos é suficiente para os mais de 200 milhões de brasileiros, mas o contexto de desigualdades faz com que sobre alimentos para alguns e falte para outros, implicando em cerca de 40 milhões de famintos e subnutridos no Brasil, conforme dados de estudo desenvolvido pelo professor Danilo Aguiar.
Em entrevista à Agência Brasil, ele aponta que milhões de brasileiros passam fome principalmente pela dificuldade de acesso à alimentação. O Brasil ocupa o quinto lugar no ranking mundial da obesidade, mas há mais de 7 milhões de pessoas passando fome e mais de 30 milhões de subnutridos. Enquanto alguns comem sem necessidade, outros não têm o que comer.
Estes milhões de desnutridos também sofrem com a falta de saneamento básico e com acesso precário à saúde mínima, o que impacta negativamente o bem-estar, a formação educacional, a empregabilidade, a dignidade da pessoa humana e até corrobora com ambientes propícios à eclosão de pandemias. Sobre a questão dasenfermidades epidêmicas vale conhecer a obra Pandemias, Saúde Global e Escolhas Pessoais, de Schuck Paim. É problema puxando problema e, todos nós, por ação ou omissão, somos responsáveise impactados por isso.
No estudo, Aguiar cita que quando se mede o volume de alimentos exportados pelo Brasil em quantidade de calorias equivalentes, tais calorias seriam suficientes para alimentar duas vezes toda a população brasileira, com uma dieta de 2 mil calorias/dia. Não faltam alimentos, falta melhor distribuição.
Aliás, sobre distribuição, todos nós deveríamos analisar, refletir e se manifestar sobre como tem sido a distribuição dos recursos no orçamento público e como os parlamentares de nosso município, de nosso estado e de nosso país têm se posicionado na aprovação e execução orçamentária - o que faz parte do exercício da cidadania fiscal. Por exemplo, enquanto faltam recursos para pesquisa, censo demográfico e campanha de esclarecimentos sobre a Covid-19, aguarda sanção presidencial o “singelo” Fundo Partidário de R$ 5,7 bilhões, triplicando o valor destinado a tal gasto.
Tudo isso requer de cada um de nós uma reflexão sobre a nossa postura humana e decidadãos, visando não só um pensar, mas também um agir com mais empatia, solidariedade e luta (no sentido de proatividade), para que, no futuro, todos possam comemorar o Dia da Pizza sem fome, o que ajudará inclusive a atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU).
A propósito, em 2015, a ONU propôs uma nova agenda de desenvolvimento sustentávelpara os próximos 15 anos: a Agenda 2030, composta por 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, vale conferir, revisitar tais objetivos e o que temos feito em prol de cada um deles.
Que tudo acabe em pizza!
Não no sentido atual: de impunidade, cunhado à época da Comissão Parlamentar de Inquérito envolvendo Paulo César Farias, mas no sentido original da expressão, de origem no radialismo esportivo paulista, quando tinha o significado de que tudo acabe bem.
MarcoTúlio da Silva
Auditor Fiscal da Secretaria de Fazenda de Minas Gerais e Membro da Comissão
Tributária da Federação Brasileira das Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite)